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'Temos de investir maciçamente em mão de obra', diz presidente da Microsoft Brasil

Executiva adverte: ‘gap’ na tecnologia já é de 400 mil vagas. ‘E, em 2025, será de 1 milhão’

Por Sonia Racy
Atualização:

Nos seus 35 anos de carreira, quase sempre em multinacionais dos setores elétrico e de automação, a executiva Tânia Cosentino, hoje presidente da Microsoft Brasil, não parou de acumular vitórias. Sob sua gestão, a empresa foi considerada por duas vezes seguidas, em 2020 e 2021, “a melhor para se trabalhar” pelo Great Place to Work. Líder ativa de programas da ONU Mulheres e do Pacto Global, ela foi a primeira mulher brasileira a presidir a subsidiária da Schneider Electric no Brasil, em 2000.

Nesta conversa com Cenários, Cosentino aponta uma questão urgente: “Há hoje, no Brasil, um ‘gap’ de 400 mil profissionais no mercado da tecnologia”. E, em 2025, “já deverão estar faltando entre 800 mil e um milhão”. Completando esse quadro, ela aponta outra tarefa inadiável: requalificar a enorme quantidade de mão de obra atualmente desatualizada que está no mercado. “E incentivar os mais jovens a buscar as áreas de exatas, que vêm sendo abandonadas.”

Presidenteda Microsoft no Brasil, Tânia Cosentino diz que número de vagas no setor de tecnologia no Brasil será de um milhão de pessoas Foto: Claudio Gatti

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Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.

A Microsoft está num setor que não tem muito do que reclamar da pandemia, né? Mas tem problemas com a mão de obra. Como você vê hoje esse cenário?

De fato, o setor de tecnologia foi um privilegiado, já que a pandemia acelerou as transformações. Isso permitiu a continuidade dos negócios, do ensino, da telemedicina, da tecnologia. Mas trouxe um estresse na chamada supply chain, os desenvolvedores de software – e isso afetou todo o mercado.

Faltam profissionais?

Sim, a continuidade do negócio pressupõe uma intensidade tecnológica de peso. Uma pesquisa da Abrascon, que reúne as empresas do setor, revela que há hoje um ‘gap’ de 400 mil profissionais nesse setor.

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Só no Brasil?

Sim, no Brasil. Mas isso atinge o mundo todo. Faltam 100 mil pessoas a mais a cada ano. Lá por 2025 vamos ter aqui de 800 mil a 1 milhão de pessoas faltando no mercado se não fizermos nada agora. E o que fazer, de fato? Incentivar jovens a buscar formação nessa área, na qual as mulheres hoje representam 17%. Engenharia, ciência de dados, tecnologia da informação, esse é o caminho do futuro do País. Esse é um lado do desafio. O outro é requalificar a enorme quantidade de gente que já está no mercado. E temos de acelerar essa capacitação.

Quem vai comandar esse processo, em nível nacional? Governo, área privada?

A ruptura é tão grande, num espaço de tempo tão pequeno, que não há governo no mundo que resolva isso sozinho. É o que chamamos de quarta revolução industrial. As anteriores levaram 40, 50 ou 100 anos. A gente costuma brincar dizendo que, na primeira dessas revoluções, o único que perdeu seu emprego foi o cavalo, que puxava as carroças. Aí vieram os carros, operários e profissionais treinados, a gente gerou emprego, gerou riqueza. Por fim, entrou a automação. Em 30 ou 40 anos, foi preciso recapacitar milhões de trabalhadores. E, agora, estamos na transformação digital, em que temos de 2020 a 2025 para capacitar 150 milhões de pessoas no planeta. Não dá.

O mundo todo precisa, né?

Sim, temos todo esse número para preencher – as vagas de TI que existirão por volta de 2025. E no Brasil, o ‘gap’ é esse de que falei há pouco, um milhão de pessoas em 2025.

Como acelerar essa requalificação? O que a Microsoft está fazendo?

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Precisamos de academia e setor privado unidos, porque todos vamos ser prejudicados se não conseguirmos requalificar. Na Microsoft, estamos fazendo parcerias com governos estaduais e o federal. O Ministério do Trabalho tem plataformas para pôr a serviço, uma delas é a Escola do Trabalhador 4.0. É uma área que milhões de pessoas acessam para buscar treinamento. A minha plataforma está lá dentro. Com os programas que temos lá, desde 2020 tivemos 5 milhões de interessados, dos quais 800 mil foram até o fim do curso.

Você falou que só 17% da mão de obra do setor são mulheres. Não é pouco?

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Sim, e é por falta de incentivo, de visibilidade. Desde criança, as mulheres não são estimuladas a gostar de exatas, como os meninos. E tem outro dado ruim: está diminuindo, a cada ano, o número de jovens que procuram exatas. Às vezes, é pura falta de informação, porque rapazes adoram um videogame... Precisava lhes dizer: “Gente, estudem tecnologia que vocês estão com o futuro garantido”. Eu tenho falado isso a cada fórum a que vou.

Como você posiciona o Brasil nesse mundo tecnológico? Muito atrasado?

A gente tem vários Brasis, diferentes níveis de maturidade. Temos sistemas sofisticados – o financeiro, por exemplo. Morei lá fora e sei o que é um banco do exterior comparado com os daqui. E agora vêm as fintechs para provocar os grandes bancos. O que nos falta é um ecossistema de inovação. Daí, esse mantra que vou repetir: temos, sim, de investir maciçamente na qualificação da mão de obra.

Mas não dá para usar a mão de obra de fora? Ou lá fora também tem escassez?

O que acontece é o contrário. Empresas de fora estão contratando nossos desenvolvedores, nossos engenheiros de cibersegurança. Eles trabalham daqui mesmo e recebem em dólar, em euro.

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