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'Excesso de capacidade é a maior doença da aviação'

Com dólar alto, TAM sente choque de custos e busca aumento de eficiência

Por Marina Gazzoni
Atualização:

O cenário econômico atual é um pesadelo para as empresas aéreas brasileiras. Com uma estrutura de custo dolarizada, ficou mais caro para elas colocar cada avião no ar este ano, após a valorização da moeda americana. A reação natural a esse choque de custos em uma conjuntura normal seria o repasse de preços ao consumidor. Mas a fraca demanda, especialmente do passageiro que viaja a negócios, torna a missão muito mais difícil, explica a presidente da TAM, Claudia Sender.

Para evitar que o avião saia vazio, a TAM tem feito promoções no fim de semana e tenta substituir o passageiro corporativo por aquele que viaja a lazer. Mesmo assim, Claudia afirma que a rentabilidade da empresa no curto prazo deve ser afetada. Para retomá-la, a TAM apertará ainda mais os cintos e deve fazer sua parte para ajudar o grupo chileno Latam, controlador da empresa, a atingir a meta de eliminar US$ 650 milhões em custos anuais até 2018.

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Qual o reflexo da desaceleração da economia para a TAM?

Tivemos um impacto muito relevante nas viagens a negócios. A demanda do cliente corporativo começou a cair durante a Copa do Mundo e seguiu fraca durante e após as eleições. Tivemos um pessimismo muito carregado entre o empresariado e uma retração importante da economia. No primeiro trimestre deste ano, o volume de viagens de negócios caiu 20% na comparação com o ano anterior. Esse foi o primeiro sintoma que sentimos, que foi seguido de um choque de custos com a alta do dólar, que também impactou as viagens internacionais, e a retração no mercado de carga aérea, que é muito ligado à atividade industrial.

Como a variação do dólar afetou a empresa?

As viagens de lazer para o exterior foram muito afetadas. Com a alta do dólar, a conta mudou para aquele passageiro que ia para Cancún em vez de ir para o Nordeste. A equação não bate mais e muitos deixam de ir. Além disso, a alta do dólar pressionou o nosso custo. Hoje, cerca de 60% das despesas da TAM estão atreladas à moeda americana, como leasing de avião, combustível e manutenção das aeronaves. Então, quando acontece uma desvalorização da moeda brasileira como a que ocorreu agora, com a perda de 20% a 25% do valor de um ano para o outro, o nosso custo sobe 12% de uma hora para a outra. E os outros 40% dos custos da companhia que são em reais também sofrem com a inflação no Brasil, que já está acima de 7%.

A redução da cotação do barril de petróleo, que influencia no preço do querosene de aviação, compensou esta alta?

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A queda no preço do combustível foi importantíssima. Se não tivéssemos essa ajuda, a situação das empresas aéreas seria muito mais complicada.

O que a empresa pode fazer em um momento em que o custo sobe e a demanda cai? Houve repasse nos preços?

Em um mercado competitivo como o nosso, a capacidade de a empresa ditar o preço fica limitada. Em um momento de queda de demanda, é difícil fazer o repasse da alta do custo nos preços. Temos feito promoções de fim de semana para trazer o passageiro de lazer para o nosso voo. No primeiro trimestre, já tivemos uma participação menor do passageiro de negócios no total. Como esse cliente costuma pagar tarifas maiores, então, tivemos uma redução de yield (tarifa média por km) no período.

Isso afeta a rentabilidade da TAM?

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Há uma deterioração da margem no curto prazo. Mas estamos fazendo um esforço para que consigamos recuperar isso por meio de corte de custos e de aumento da eficiência. A nossa estratégia é maximizar a receita total do avião. Não faz diferença se ela vem de um passageiro que pagou R$ 100 ou de 100 que pagaram R$ 1. Não faz sentido voar com o avião mal aproveitado. A passagem aérea é um produto perecível. Quando o avião decola, aquele assento vazio nunca mais poderá ser vendido. Tem dado certo, porque a nossa taxa de ocupação dos voos continua a crescer e está acima de 80%, um dos melhores indicadores que a empresa já teve.

A TAM já vem cortando custos desde 2012. Ainda há o que enxugar?

Sim, sempre existe espaço para melhorar a produtividade. Temos várias iniciativas em curso, por exemplo, para melhorar a agilidade do embarque facilitando o check-in pela internet ou pelo celular e outras para melhorar a pontualidade dos voos. São avanços que são bons para o passageiro e ao mesmo tempo reduzem o custo da TAM. A aviação é uma indústria sensível a muitos custos que vão além do nosso controle, como o câmbio e o preço do combustível. Mas queremos garantir que dominamos todas as variáveis possíveis. Não temos uma lupa, mas um microscópio nos custos. Isso quer dizer que vamos voar só as rotas que fazem sentido serem voadas e ter disciplina de capacidade. O excesso de capacidade é a maior doença dessa indústria. É isso que faz com que as companhias se desesperem e entrem na roda-viva promocional eterna e não consigam cobrir o seu custo de operação.

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A TAM fará demissões?

A nossa previsão é de estabilidade da demanda e da oferta no cenário atual, que já considera um momento difícil. Como não temos planos de reduzir a capacidade, não há impacto previsto na tripulação. Mas ainda é cedo para falar. Os próximos 12 a 18 meses serão um período complicado para o País. Se houver uma deterioração muito grande da economia brasileira, nossa posição pode ser diferente.

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A TAM foi afetada pelo ajuste fiscal?

O maior impacto da empresa será consequência da proposta de desoneração da folha de pagamento, que ainda está em debate. Estamos esperando uma definição sobre isso e eu espero que isso possa ser rediscutido. Se a proposta passar do jeito que foi enviada, o impacto pode ser significativo para as empresas aéreas. A Abear (associação do setor) calculou que o setor como um todo teria cerca de R$ 1 bilhão de aumento de custo caso a desoneração da folha saísse. Essa medida seria mais um choque de custo neste momento difícil. Por isso, acreditamos no debate com o governo.

A crise levou a ajustes da malha?

Sim, sempre fazemos ajustes pontuais na nossa malha conforme o mercado muda. A queda da demanda corporativa criou um excesso de capacidade em alguns mercados e então realocamos nossa oferta para outras cidades. Este ano, apesar de nosso plano de manutenção da capacidade, vamos atender quatro novas cidades – Bauru (SP), São José dos Campos (SP), Juazeiro do Norte (CE) e Jaguaruna (SC). Os novos destinos só se viabilizaram porque fortalecemos o nosso “hub” (centro de distribuição de voo) de Brasília.

Como assim?

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A estrutura de hub é o que tem nos permitido ampliar a malha sem aumentar a capacidade. Brasília foi escolhida como nosso principal hub para voos nacionais por sua localização central. Com o hub podemos atender o passageiro de Porto Alegre, por exemplo, que quer ir para Juazeiro do Norte, por meio de uma conexão em Brasília. Lá ele se junta com outros passageiros de várias regiões que querem viajar para o mesmo destino e o voo se torna viável. Sem o hub, essa conectividade nunca seria possível.

A TAM alterou seus planos de expansão de frota?

Por enquanto, não. O nosso planejamento de expansão é focado no longo prazo, até pela característica da indústria. Em dezembro deste ano, por exemplo, vamos receber o nosso primeiro Airbus 350, cujo contrato foi assinado há sete anos, muito antes de eu estar aqui e em um momento em que o cenário da economia brasileira era completamente diferente. Na hora que a empresa fez a compra, ela olhava para uma perspectiva de crescimento de 20 anos. No setor aéreo, é necessário ter uma estratégia clara de longo prazo e estar preparado para vivenciar os ciclos da indústria.

A companhia afirmou recentemente que avalia a compra de aviões menores para fazer voos regionais. A TAM mantém esse plano?

Sim. A aviação regional no Brasil continua sendo uma oportunidade interessante de crescimento, até porque os grandes mercados estão com sobreoferta. Este ano já vamos deslocar nossa capacidade para quatro cidades do interior. Por enquanto, estamos servindo esses mercados com a nossa frota atual, mas acho que no futuro vamos precisar de uma aeronave menor para atender essas cidades. O projeto está em estudo, mas com as novas variáveis de combustível e câmbio temos de refazer as contas. Isso não é um privilégio da TAM ou da aviação. Várias indústrias estão refazendo as contas para reavaliar planos de investimento.

A TAM vai adiar os pedidos de aeronaves já feitos?

Não temos planos nesse sentido por enquanto. Mas como o grupo Latam atua em sete países, temos flexibilidade para alocar os aviões onde houver maior demanda. 

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A TAM acumula dois anos de prejuízo. É possível ser rentável neste ano?

Trabalhamos para isso. Este vai ser um ano macroeconomicamente complicado para o Brasil, mas trabalhamos com foco no longo prazo para sair desse momento de forma mais sólida e competitiva possível.

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