26 de janeiro de 2017 | 05h32
Uma das grandes questões que se colocam em uma época de inovações e mudanças cada vez mais aceleradas é o efeito da tecnologia sobre o emprego. Como isso vai afetar a vida das pessoas? Qual o impacto sobre carreiras e negócios? A tecnologia melhora ou piora as perspectivas de emprego da população?
A discussão é complexa, e começou há muito tempo atrás. Por si só, isso já é um elemento relevante a ser analisado cuidadosamente: esse debate não é novo. Durante praticamente toda História da Civilização, novas tecnologias precipitaram mudanças e, consequentemente, uma discussão sobre o efeito na força de trabalho.
Leia outras colunas de Guy Perelmuter
Aristóteles, filósofo da Grécia Antiga, escreveu que “os serventes são um instrumento que deve ser priorizado perante todos os outros instrumentos” e destacou que, se existisse uma forma de realizar determinado trabalho sem a interferência humana, essa forma seria escolhida, liberando as pessoas para outras atividades. Os governos de diversas civilizações milenares buscaram formas de ocupar a população desempregada em função de alguma inovação técnica, chegando a extremos de rejeitar ou mesmo proibir qualquer inovação que impactasse o mercado de trabalho. De acordo com o economista e historiador Robert Heilbroner, durante a Idade Média, pessoas que tentassem negociar ou promover mercadorias que pudessem ser classificadas como “inovadoras” eram executadas como os piores criminosos.
O movimento Ludita, ocorrido na Inglaterra durante a Primeira Revolução Industrial, uniu trabalhadores que estavam vendo sua mão de obra ser substituída por máquinas - e inspirou o atual Neoludismo, filosofia que basicamente se opõe ao desenvolvimento tecnológico. A origem da palavra “sabotagem”, alguns dizem, é o termo “sabot” - sapatos de madeira que os operários do final do século XVIII e início do século XIX jogavam nas máquinas industriais para quebrá-las.
Neste ambiente nasce a ciência econômica moderna e começa um debate que até hoje permanece sem resposta: existe “desemprego tecnológico”? De um lado, nomes como Robert Malthus e Karl Marx argumentavam que sim, e de outro Charles Babbage (uma das figuras mais importantes da história da computação) e Jean-Baptiste Say (“a oferta cria sua própria demanda”) diziam que não. Ao longo do século seguinte, a discussão continuou, mas as evidências apontavam para uma visão positiva do futuro apesar de duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945): em geral, o progresso tecnológico estava melhorando a qualidade de vida de todas as classes sociais, tanto operários quanto patrões.
Nos últimos anos do século passado, a expansão do processo de globalização levou diversos pensadores, economistas e jornalistas a ponderar seus efeitos de médio e longo prazo - e novamente a inovação e a automação passam ao centro do debate em função de seus impactos potenciais no mercado de trabalho. Em 1996, dois jornalistas europeus (Hans-Peter Martin e Harald Schumann) publicaram “A Armadilha da Globalização”, argumentando que apenas 20% da população economicamente ativa seria suficiente para manter a economia mundial em funcionamento - forçando os governos a sustentarem os outros 80%. O livro “O Fim dos Empregos”, de 1995, do economista norte-americano Jeremy Rifkin também antecipa a eliminação de milhões de empregos em função das inovações tecnológicas, e o crescimento do setor de serviços voluntários apoiados pelo governo.
Até hoje, a inovação tem sido catalisadora da chamada “destruição criativa” - ou seja, os empregos não são eliminados, mas sim transferidos para outros setores (por exemplo, do setor agrícola - que foi extremamente automatizado - para o setor de serviços). Mas há quem ache que esse cenário está para mudar - para pior. Esse será nosso tema da semana que vem. Até lá. *Investidor em novas tecnologias, é Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.