A situação fiscal na Europa e o nível de apetite por risco de investidores internacionais devem continuar com papel central no mercado de câmbio do Brasil em março, após o dólar ter caído 4,14% em um mês marcado pela volatilidade.
A moeda norte-americana terminou fevereiro cotada a R$ 1,807, após ter oscilado entre R$ 1,799 e R$ 1,897 ao longo do mês. Somente nesta sexta-feira, 26, a baixa foi de 1,31%.
A queda acumulada não foi suficiente para anular toda a alta de janeiro e, no ano, o dólar ainda registra avanço de 3,67%.
"No curto prazo, (a taxa de câmbio) vai ser determinada, muito, sobre como esse assunto da Grécia vai evoluir", avaliou André Sacconato, economista da Tendências Consultoria.
Nesta sessão, por exemplo, a baixa da moeda americana se acentuou na metade do dia, quando surgiram informações, não confirmadas, de que o banco estatal alemão KfW comprará bônus da Grécia como parte de um pacote de ajuda europeu ao país.
O enorme déficit fiscal da Grécia, de 12,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009, tem assombrado a zona do euro, com o temor de uma recaída da recente crise financeira. O governo alemão não quis comentar a possível ação do KfW.
Nas próximas semanas, o mercado aguarda notícias sobre a possível ajuda europeia à Grécia e sobre novas medidas do país para frear os gastos e aumentar as receitas. Além disso, deve haver em breve uma emissão de bônus do país.
Além da Grécia, outros fatores podem contribuir para um aumento da aversão a risco, como problemas fiscais em outros países e o ritmo do aperto monetário nas principais economias, como os Estados Unidos. Na próxima sexta-feira, por exemplo, serão divulgados dados oficiais sobre o mercado de trabalho norte-americano referentes a fevereiro.
Sem sustos, Grécia pode ajudar real
Mas os problemas na Europa não elevam necessariamente o dólar. Milton Wagner, diretor da Wagner Investimentos, argumenta que, caso a situação continue ruim mas sem grandes sustos, é provável que haja uma fuga de recursos do continente europeu rumo a outros ativos, como commodities e até o real.
Isso chegou a ser registrado na metade de fevereiro, quando a atuação de estrangeiros permitiu que o real se valorizasse mesmo com o euro ainda fraco ante o dólar. Ao final do mês, a moeda única acumula queda de 1,7%.
Nas palavras de um gerente de câmbio de um banco local, que preferiu não ser identificado, "o que o mercado tem falado muito é que a aversão ao risco europeu tem trazido fluxo para o dólar e também para outras moedas de emergentes".
Outros fatores podem contribuir para forçar o dólar abaixo de R$ 1,80. De acordo com Sacconato, da Tendências, a balança comercial costuma ter superávit maior em março, quando aumentam os embarques da safra de soja.
Além disso, o possível aumento do juro básico no Brasil pode tornar mais atrativos os investimentos em renda fixa no país, embora com influência menor.
"A maior probabilidade para o dólar no mês que vem é que fique entre R$ 1,85 e R$ 1,75. Mas, quando oscilar, acho mais fácil ir para baixo do que para cima", avaliou Wagner.
A possibilidade que o dólar ceda abaixo de R$ 1,80 em um cenário de menor aversão a risco no exterior, porém, reacende a discussão sobre possíveis compras de dólares pelo Fundo Soberano. Em janeiro, a incerteza sobre a atuação do governo afastou o dólar do patamar de R$ 1,70.
Por enquanto, o Tesouro sinaliza que não intervirá no mercado de câmbio. Mas, com as compras já autorizadas após a criação do Conselho Deliberativo do Fundo, é possível que o tema volte à pauta. (Por Silvio Cascione)
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