Publicidade

Dólar fecha no maior valor desde 15 de abril com Auxílio Brasil fora do teto; Bolsa cai 3,3%

Moeda subiu 1,33% hoje, de olho em proposta do governo de conceder benefício de R$ 400 em 2022, mas com R$ 100 sendo pagos fora do teto de gastos; Ministério da Cidadania adiou anúncio do programa

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

O mercado local voltou a amargar perdas nesta terça-feira, 19, diante da informação de que o governo considera utilizar recursos fora do teto para bancar os custos com programas sociais. Perto do final do pregão, o Ministério da Cidadania adiou, indefinidamente, o anúncio do Auxílio Brasil, que estava marcado para às 17h de hoje - mesmo assim, os ativos foram penalizados. O dólar fechou em alta de 1,33%, a R$ 5,5938 - no maior valor desde 15 de abril. A Bolsa brasileira (B3) teve baixa de 3,28%, aos 110.672,76 pontos - no maior recuo desde 8 de setembro.

PUBLICIDADE

Como mostrou o Estadão/Broadcast, o governo pretendia lançar nesta terça-feira o programa assistencial para substituir o Bolsa Família com valor de R$ 400 em 2022, ano em que o presidente Jair Bolsonaro buscará a reeleição. Parte desse valor, cerca de R$ 100, seria contabilizado fora do teto de gastos, âncora fiscal do País. 

O caldo entornou de vez ao longo da tarde diante da informação, apurada pelo Estadão/Broadcast, de que a despesa com o programa social que ficará fora do teto pode ter seu valor fixado em uma PEC. A equipe econômica trabalharia na contenção de danos, na tentativa de limitar a despesa extrateto a R$ 30 bilhões, enquanto o Palácio do Planalto considerava esse valor ainda "em aberto".

Nem mesmo os ganhos de Nova York ajudaram a Bolsa hoje, que não ficou no positivo em nenhum momento do pregão. Foto: Gabriela Biló/Estadão

  

A decisão, que representa uma vitória da ala política do governo, porém, poderia levar a novas baixas no Ministério da Economia, já que, embora o gasto seja temporário, vai contra o que vinha sendo defendido pela pasta.  

Também ecoavam nas mesas de operação as declarações de ontem do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de que não se pode "pensar só em teto de gastos e responsabilidade fiscal" em detrimento da população - lidas como uma senha para abandono da regra fiscal pela classe política. Para piorar, a reforma do Imposto de Renda, tida como uma das fontes de financiamento do Auxílio Brasil, sofreu um duro golpe após o relator da proposta no Senado, Angelo Coronel (PSD-BA), afirmar que não tem data para apresentar seu parecer

Além disso, a reunião da comissão especial da PEC dos precatórios prevista para hoje às 14h, foi adiada para amanhã. A aprovação da PEC abriria, em tese, espaço para compatibilizar um Auxílio Brasil maior com o respeito à âncora fiscal.

Publicidade

Em uma escalada contínua, o dólar chegou a tocar na casa de R$ 5,61, ao registrar máxima de R$ 5,6123, alta de 1,66%, logo após à 16h. Mais cedo, o Banco Central vendeu US$ 500 milhões à vista, mas o alívio no câmbio foi passageiro. O dólar para novembro subiu 1,31%, a R$ 5,5980.

Operadores notaram nova onda de zeragem de posições à medida que se aproximava o horário do anúncio formal do Auxílio Brasil, às 17h. A febre compradora amainou após o Ministério da Cidadania cancelar o evento de lançamento do programa, com a moeda americana perdendo o fôlego e chegando a ser negociada momentaneamente abaixo da linha de R$ 5,58. O movimento, porém, foi pontual.

Seja qual for o desfecho da proposta, analistas e operadores ouvidos pelo Estadão/Broadcast são unânimes em afirmar que o governo vai abandonar, mesmo que informalmente, o teto de gastos. As consequências são uma piora das condições financeiras, cuja consequência é a formação de uma espiral negativa para a economia: alta do dólar, deterioração das expectativas de inflação, maior aperto monetário e redução do crescimento.

O sócio e gestor da Galapagos Capital, Sergio Zanini, afirma que a "sinalização do governo é muito negativa" e ressalta que o mercado em nenhum momento trabalhava com a hipótese de um Auxílio Brasil no valor de R$ 400. "O furo parcial do teto é uma preocupação grande. Não é só o que está sendo falado hoje. Existe os risco de execução quando isso for debatido no Congresso", afirma Zanini, chamando a atenção para o fato de que pela primeira vez se viu o presidente da Câmara "falar explicitamente" contra o teto dos gastos.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Para Zanini, tendo em vista o que está sendo proposto com o Auxílio Brasil e os sinais da classe política, já não fará diferença para a precificação dos ativos domésticos se houver novas baixas na equipe econômica e até mesmo a eventual saída de Paulo Guedes do governo, como chegou a ser ventilado em certo momento do dia. "Pode colocar quem você quiser como ministro da Economia que o resultado não vai ser diferente. Entramos em um processo política e eleitoral", diz o gestor da Galapagos.

Diante da deterioração do ambiente fiscal, Zanini diz que o BC tem pouco a fazer, já que um choque de juros poder agravar ainda mais a percepção sobre a dinâmica das contas públicas. "Ele está tentando neutralizar parte relevante dos fluxos de saída com as intervenções. Mas a realidade é que o fundamento econômica está piorando e isso tem impacto no câmbio", diz.

Em evento do Banco JP Morgan, o diretor de Política Econômica do BC, Fabio Kanczuk, disse que as intervenções da autoridade monetário no mercado de câmbio não vão mudar "de maneira nenhuma" e que "o nível do câmbio não importa e nem o impacto nas projeções de inflação". Kanczuk reconheceu que o BC tem dificuldades em entender os motivos por trás da depreciação do real.

Publicidade

Bolsa

O Ibovespa teve uma terça-feira que se assemelhou ao 8 de setembro, quando o mercado começava a colocar no preço a volta do ex-presidente Lula à política, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Diante do impasse em torno do Auxílio Brasil, o índice nem se quer mirou o positivo, se distanciando do bom desempenho de Nova York, com Dow Jones em alta de 0,56%, o S&P 500, de 0,74%, e o Nasdaq, de 0,71%. Nos Estados Unidos, dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) se comprometeram em usar os instrumentos necessários para conter alta de preços, se for preciso.

Aqui, pressionado pela aguda percepção de risco fiscal, que pode colocar em questão a lealdade de parte da equipe econômica à agenda de reeleição, com rumores sobre possíveis baixas no quadro técnico, a referência da B3 chegou a mostrar perda de 3,92% no pior momento da tarde, aos 109.947,21 pontos. Na semana, o índice tem perda de 3,47%, no mês, de 0,28%, e no ano, de 7,01%.

Entre as ações de maior liquidez, mesmo com o desempenho positivo do petróleoPetrobras puxou a fila de perdas, com a PN em queda de 4,89% e a ON, de 4,37% no fechamento, enquanto Vale ON mostrava perda de 1,15%, as siderúrgicas, de até 3,05% para Usiminas PNA, e as de grandes bancos chegavam a 4,91%para Banco do Brasil ON, refletindo a aversão ao risco fiscal que se impôs desde cedo na sessão. 

Apenas uma ação da carteira teórica conseguiu se desgarrar do mal-estar geral: GetNet registrou ganho de 17,88%, após estrear ontem tanto na B3 como no Ibovespa. /ANTONIO PEREZ, LUIS EDUARDO LEAL E MAIARA SANTIAGO

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.